sexta-feira, 6 de março de 2009
Repentes e Repentistas (livro) - Parte 07
Um estilo que eu admiro muito no repente improvisado é “A Gemedeira”. Trata-se de um estilo onde os poetas podem abordar qualquer assunto, dependendo da vontade e do gosto de cada um. Eles podem falar de futebol, de política, de religião e até de fatos que tenham acontecido e despertado a atenção do povo.
Aqui, eu também faço uma tentativa de deixar registrado este meu trabalho, pedindo desculpas aos ilustres poetas repentistas, se alguma falha for notada. Afinal, eu sou apenas um admirador dos grandes poetas. Vejamos como ficou o trabalho:
Eu escolhi esse estilo pra poder cantar gemendo,
Tem gente que geme a toa dizendo que está sofrendo,
Chora e geme, geme e chora: ai – ai- ui- ui
Parece que está morrendo.
Meu primo vive gemendo dizendo que é dor de dente,
Mas tem gente que não chora, nem sente o que ele sente,
Outros passam a vida inteira: ai – ai – ui – ui
Chorando sem estar doente.
Eu conheço muita gente que chora sem sentir nada,
Um rapaz que vive só, chora pela ex-namorada,
Mas meu pai que vive triste: ai – ai – ui- ui
Chora pela empregada.
Quem chora sem sentir nada deve ter uma razão:
Pode ser uma saudade que feriu seu coração,
Mas minha vizinha chora: ai – ai – ui – ui
Com saudades do patrão.
Quem sente no coração um amor desesperado,
Chora de noite e de dia, só pode ser um coitado,
Mas pior é o que chora: ai – ai – ui – ui
Nas garras do delegado.
Esse é um desgraçado, um sujeito sem nobreza
Pois quem chora na cadeia se reveste de tristeza
Tenho pena é de quem chora: ai – ai – ui – ui
Por não ter um pão na mesa.
Quem não tem um pão na mesa, também não tem alegria,
Trabalha e não ganha muito, vive em grande agonia,
Olha pra mulher e diz: ai – ai – ui – ui
Nós vamos vencer um dia.
Sinto muita simpatia por quem trabalha com fé,
Também tenho uma família, só um filho e a mulher,
Mas eu choro quando estou: ai – ai – ui – ui
Amando quem não me quer.
Quem vive sem ter mulher deve ser um desgraçado,
Porque ter mulher é bom e é por Deus abençoado,
Quem não gosta de mulher: ai – ai – ui – ui
Ou é louco, ou é veado.
O homem mal educado nunca pensa no que faz,
Abre a boca e diz besteira mostrando ser incapaz,
Depois chora arrependido: ai – ai – ui – ui
“Assim eu não tenho paz”.
Todo homem mal que faz o que a razão condenou,
Precisa se arrepender de tudo que praticou
E chorando confessar: ai – ai – ui – ui
Assim feliz eu não sou.
Minha prima se casou com um cara bem dotado,
Arrependida, dizia com o rosto amargurado:
Se eu soubesse que era assim: ai – ai – ui – ui
Eu não tinha me casado.
Vi doutor e chapeado contando seus sofrimentos,
Um dizia: estou fraco; o outro: já não agüento,
E os dois choravam juntos: ai – ai – ui – ui
Cada um com seu lamento.
Eu conheci um sargento que da farda se afastou,
No quartel já foi destaque, muitas medalhas ganhou,
Mas lamenta todo dia: ai – ai – ui – ui
Ninguém sabe quem eu sou.
O Brasil se abalou com um fato comovente:
O Edifício Joelma pegou fogo de repente
Chorando alguém perguntava: ai – ai – ui – ui
Quem pode salvar a gente?
Os bombeiros já presentes, invadiram o lugar
Fazendo todo o possível para o fogo apagar
Lá de dentro alguém gritava: ai – ai – ui – ui
Só Deus pode nos salvar!
Vi o jornal publicar que muita gente morreu,
O repórter comovido a notícia escreveu,
Quem escapou sussurrava; ai – ai – ui - ui
Foi um milagre de Deus!
Foi isso que aconteceu naquele tempo passado
Num edifício tão nobre, relíquia daquele Estado,
Quando eu lembro ainda choro: ai – ai – ui – ui
O assunto tá encerrado.
(Adalberto Claudino Pereira)
Há momentos em que o poeta repentista aproveita para fazer apelos, sejam eles aos políticos, às autoridades constituídas, e até à própria sociedade. Isso é feito, na maioria das vezes nos motes em sete sílabas, como poderemos ver neste nosso trabalho, onde mostramos uma realidade que muitos fazem questão de torná-la insignificante, mas que não deixa de ser algo essencial para a nossa sociedade, principalmente para aquela de baixa renda. O trabalho tem como tema: “O povo, seu Presidente, está cansado de sofrer”.Vejamos como ficou:
Vou começar relembrando o tempo da escravidão,
Quando os negros da Nação viviam acorrentados;
Eles eram maltratados, apanhavam até morrer,
E nenhum chegava a ter uma vida diferente:
O povo, seu Presidente, está cansado de sofrer.
O Brasil, nossa Nação, tem uma história bonita,
É o Brasil dos artistas, do algodão, ouro branco,
Do nordestino que é franco, firme e forte pra valer,
Na hora de escrever mostra que é inteligente:
O povo, seu Presidente, está cansado de sofrer.
A pobreza continua chorando sem esperança,
E a sua grande herança é passar fome e esperar,
Não cansa de trabalhar pra o senhor se eleger,
O senhor precisa ver como vive essa gente:
O povo, seu Presidente, está cansado de sofrer.
No País a violência é manchete dos jornais,
E o Governo nada faz pela nossa segurança,
Já perdi a esperança de tudo isso vencer,
Não se pode mais dizer que se tem vida decente:
O povo, seu Presidente, está cansado de sofrer.
As estradas destruídas, estão cheias de “crateras”,
E o povo na espera, não passa de um sofredor,
Todos pedem: “por favor, mostra a nós o seu poder,
O mundo precisa ver um Brasil forte e pra frente:
O povo, seu Presidente, está cansado de sofrer.
O pobre aposentado está perdendo os seus direitos!
Pelo visto, desse jeito, termina pedindo esmola,
Só lhe falta a sacola, já não sabe o que fazer,
Se o senhor nos esquecer, não há pobre que agüente:
O povo, seu Presidente, está cansado de sofrer.
No Palácio do Governo inventaram o “mensalão”
E o povo ficou na mão, sem direito a defesa.
Os ministros, com certeza, nenhum castigo vão ter,
Uns chegaram a se eleger e estão lá novamente:
O povo, seu Presidente, está cansado de sofrer.
Eu sei que a culpa é do povo, que agüenta tudo calado,
Mas se um pobre coitado fosse dizer o que pensa,
Com certeza a imprensa nada podia escrever.
Os jornais não iam ter espaços pra essa gente:
O povo, seu Presidente, está cansado de sofrer.
As rádios que o senhor tem nunca falam a verdade,
Só dizem barbaridades para o povo enganar.
Elas só sabem falar que o Governo vai fazer,
E que vai acontecer coisas boas pela frente
O povo, seu Presidente, está cansado de sofrer.
O senhor não sofre nada, pois só anda de avião,
Se andasse pelo chão, como os seus eleitores,
Ia sentir os horrores e não ia mais querer
Em seus discursos fazer promessas tão indecentes:
O povo, seu Presidente, está cansado de sofrer.
A nossa educação há muito está falida
O professor leva a vida só de paralisações.
E nas salas as lições ninguém consegue aprender
Todos tentam esconder a preguiça dos docentes:
O povo, seu Presidente, está cansado de sofrer.
Os bandidos estão soltos perseguindo o cidadão,
Nossa Constituição está desatualizada,
Mas precisa ser mudada, basta a Câmara querer,
Nós precisamos rever os artigos mais prementes
O povo, seu Presidente, está cansado de sofrer.
A corrupção está invadindo os quartéis,
Dos tenentes aos coronéis todos recebem propinas,
Maconhas e cocaínas são fáceis de se vender,
Nas prisões o PCC está muito mais potente:
O povo, seu Presidente, está cansado de sofrer.
Juizes e delegados já não merecem respeito,
Se vendem de qualquer jeito para ganhar muito mais
Me diga, quem é capaz do cidadão defender?
Quando é que vamos ter um tratamento decente?
O povo, seu Presidente, está cansado de sofrer.
O cidadão brasileiro, que não fez nada de mal
Vive como um anormal, preso em sua residência,
É muita incoerência para o povo entender:
Quem é que vai combater a ação dos delinqüentes?
O povo, seu Presidente, está cansado de sofrer.
A saúde no Brasil é produto em extinção,
Só quem não tem coração vê tudo e não faz nada
Na fila, de madrugada, já vi um velho dizer:
Eu acho que vou morrer, não tem cristão que agüente!
O povo, seu Presidente, está cansado de sofrer.
Somente seus puxa-sacos dizem que tudo está bem,
Porque nenhum deles tem vergonha e dignidade,
Não sabem que a verdade dá pra todo mundo ver,
Eles ganham para ser os inimigos da gente:
O povo, seu Presidente, está cansado de sofrer.
O povo está esperando os empregos prometidos,
Que devem estar escondidos para outras eleições.
Quem tem muitas condições pode o melhor escolher
Muitas palmas vai bater quem é subserviente:
O povo, seu Presidente, está cansado de sofrer.
Nosso trânsito também é uma coisa engraçada,
Os carros pelas calçadas tomando o nosso lugar.
Não podemos reclamar, pois ninguém vai atender,
Aquele que se meter pode achar um delinqüente:
O povo, seu Presidente, está cansado de sofrer.
Quem disse “País de todos”, ou bebeu, ou está louco,
Este é um País de poucos, os da fatia maior.
Quem tem a parte menor, vive longe do Poder,
Esse vive por viver, sem passado e sem presente.
O povo, seu Presidente, está cansado de viver.
A propaganda é bonita, todos pensam ser verdade,
São grandes as falsidades nas manchetes dos jornais
As notícias irreais que aparecem na tevê,
Na verdade ninguém vê o quanto a imprensa mente.
O povo, seu Presidente, está cansado de sofrer.
Essa gente mentirosa prega na televisão,
E diz que o pobre é patrão de quem mora na Alvorada
Que mentira desvairada! O PROCON precisa ver,
Pra processar e prender quem tenta enganar a gente:
O povo, seu Presidente, está cansado de sofrer.
O Brasil é um país cheio de contradições,
Criminosos e ladrões são protegidos por lei,
Nos morros, bandido é rei, um osso duro de roer,
Que manda até recolher, todo o cidadão decente:
O povo, seu Presidente, está cansado de sofrer.
Estão usando o petróleo para enganar o povo,
Estão dizendo de novo que o país tá indo bem,
Só não mostram quem não tem um pão seco pra comer,
E não sabe o que fazer quando o filho está doente:
O povo, seu Presidente, está cansado de sofrer.
Já cansei de reclamar, já que ninguém reclamou,
Muita gente já tentou, mas ninguém lhe deu ouvido,
Nesse país eu duvido que alguém vá entender,
Quando o povo resolver falar alto em tom ardente:
O povo, seu Presidente, está cansado de sofrer.
Tem muita gente covarde, que nesta hora se esconde,
Nem pergunta, nem responde, parece que nem existe.
Eu fico bastante triste, mas nada posso fazer,
É melhor ninguém mexer com quem tem alta patente:
E deixar o Presidente fazer o povo sofrer.
(Adalberto Claudino Pereira)
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